Interrogo-me como posso responder a esta questão, do lugar de profissional. Afinal, muito antes de ocupar esta função, já havia certamente escutado, inúmeras vezes, que “fulano” é um pouco psicólogo, minha “prima” (ou advogado, ou melhor amigo, etc…) é um pouco psicólogo”…
Quem nunca fez esta singela associação à pessoa de alguém que está disposto a oferecer um momento de acolhimento e escuta? Até porque acolhimento e escuta são, com efeito, as principais finalidades que buscamos quando expomos, diante de outra pessoa, nosso sofrimento. Alguns, mais do que outros, também esperam um conselho, uma opinião que tenha efeito norteador do conflito existente. E é neste ponto que penso existir um divisor de águas entre aquele que acolhe, escuta e dá sua opinião pessoal e aquele que acolhe, escuta e interroga este sujeito que está sofrendo.
A resposta para esta questão, portanto, está em saber melhor o que, de fato, faz um psicólogo. Independentemente da abordagem teórico-clínica, um profissional da psicologia ou da psicanálise posiciona-se de um modo peculiar diante do sofrimento alheio. A escuta clínica exige uma neutralidade afetiva para que a narrativa do paciente e as palavras que a compõem possam ser devolvidas em forma de questões a serem por ele elaboradas. Sim, questões. No plural! Pois, se existe um sofrimento decorrente de determinada situação, é importante descobrir não somente como lidar com isso, mas perceber que há uma quota própria de participação nesta realidade que se apresenta e que, em alguns casos, repete-se ao longo da vida. Ou seja, a prática clínica de um psicólogo consiste em um verdadeiro tratamento, cujo processo ultrapassa um direcionamento objetivo e pontual. O que se trabalha em uma psicoterapia ou em uma análise pessoal é da ordem da subjetividade e de toda a complexidade que a envolve, sendo este um importante aspecto ignorado pela grande maioria das pessoas.
Em geral, o único objetivo daquele que busca um psicólogo é aplacar a angústia. Em outras palavras, estancar o sofrimento. E isto é até possível, inclusive no início do tratamento. Entretanto, diferentemente daquele amigo que “parece” um “pouco” psicólogo, o direcionamento oferecido pelo profissional é isento de opinião pessoal, de projeções e aconselhamentos. Ao menos é assim que deve ser, pois o que se espera de um bom profissional desta área é que, ele próprio, tenha ocupado, da forma devida, o lugar de paciente. Sim, porque não basta apropriar-se, através de um diploma, de teorias e de tentar encaixá-las na pessoa do paciente. Para aprender a escutar efetivamente o outro é preciso, primeiro, aprender a se escutar. Ressalte-se, além disso, que a psicoterapia, sendo um tratamento, exige frequência, regularidade e responsabilidade por parte do paciente. Curiosamente, por esta mesma razão, muitos desistem… Afinal, para que serve mesmo aquele amigo que é um “pouco psicólogo”?